domingo, 25 de dezembro de 2011

A JANELA ANTIGA


Nos anos setenta eu trabalhei no centro da cidade,  num prédio encostado ao local onde mais tarde foi construída a Estação Anhangabaú do metrô.


Da janela da minha seção, durante as longas horas de serviço, eu ficava observando um prédio muito antigo, do outro lado da rua.

No segundo andar havia um balcão e uma flor vermelha plantada numa lata de óleo. Ali morava uma velhinha muito velha,  com um gato amarelo.

 Nunca vi ninguém além dela ali naquele balcão: era ela que regava a flor, todas as manhãs. E todas as tardes ela  ficava ali olhando o movimento da rua, com o gato no colo. 

Sábados e domingos eu não sei, pois eu só voltava na segunda-feira...

O tempo passou, eu fui mudando de emprego, mas  num dia de Natal voltei ao centro da cidade - dessa vez de metrô, pela Linha Vermelha - e tive a alegria de ver o prédio antigo, encravado entre dois outros edifícios. Estava meio abandonado, sujinho, pichado, porém ali firme. 

Olhei para o segundo andar, como fazia antes. A janela alta estava fechada, e acho que  ninguém mais morava ali. Não vi a lata de óleo nem a flor, nem as luzinhas que a velhinha pendurava nos ferros nessa época.  Nada.

Uma tristeza besta me entrou no peito, e escrevi um poeminha.

A JANELA ANTIGA

Tinha uma janela antiga
num prédio também antigo,
daqueles que havia antes
- não tem mais.

Tinha um balcão e uma flor
plantada na lata de óleo
e bandeirinhas coloridas
- não tem mais.

Tinha uma senhora velhinha,
morando ali com seu gato 
e as lembranças da vida
- não tem mais.

foto: site São Paulo Antiga


agosto 2007